O júri do "Caso Isabela": a visão de um criminólogo
Após cinco dias em plenário chegou ontem ao final o júri do "Caso Isabela" com a condenação de ambos os acusados.
Aspectos positivos: a atuação serena do MP e profissional de Robert Podval, a valoração das provas técnicas, atuação isenta do juiz Maurício Fossen etc.
Aspectos negativos: agressão física contra o Dr. Podval na porta do fórum, comemorações com foguetes da "turba" depois do resultado (pensei que gritavam Barrabás, Barrabás) etc.
O júri acabou, mas o processo continua com os recursos. Demoraremos ainda alguns anos para que o caso chegue o fim com o trânsito em julgado da última sentença.
Poderão ocorrer outros júris do mesmo caso. A defesa informou que levantará a existência de nulidades e há dezenas de questões jurídicas polêmicas (ex: protesto por novo júri) que podem beneficiar a defesa nos tribunais superiores.
No júri que terminou ontem foram as prova periciais que brilharam. O conjunto de evidências superou a retórica de ambas as partes. Isso foi patente.
Todavia, não podemos nos esquecer de uma dura realidade. O júri de ontem é uma exceção. Pelo Brasil afora diuturnamente júris são decididos, em grande parte dos casos, pelos depoimentos de testemunhas e com uma prova pericial da década de setenta do século passado. Algo está muito errado.
Há tecnologias hoje disponíveis para se subsidiar um processo criminal e não há investimentos decente dos governos estaduais nisso. Investiga-se, processa-se e julga-se, regra geral, como os advogados, promotores e juízes o faziam a trinta anos atrás.
Em vez de "entregar viaturas" em cerimônias medievais para um Estado Democrático de Direito deveriam os governadores estaduais quitar esse débito que começou com os seus antecessores (pois o problema não surgiu nos últimos mandatos, é mais antigo).
Investir, investir e investir de forma qualificada. Coletar digitais deveria ser a regra e todos os locais de crime e sabemos que isso não ocorre. Pelo contrário, o local do crime é, em muitos casos, violado (até por agentes públicos). Luminol (conheço esse produto apenas de livros e pela TV, após atuar 14 anos na área criminal) deveria estar presente em todas as cidades consideradas mais violentas e não apenas nas capitais.
Criminalística, Criminologia, Psicologia, Psiquiatria, Psicanálise etc podem contribuir muito para os julgamentos e infelizmente são vistas apenas como "ciências auxiliares" do Direito Penal por muitos. O Direito, para esses, basta em si mesmo. Pura arrogância metodológica. O conhecimento é uno e o Direito não é seu dono. Precisamos ter mais humildade e aprender com as outras áreas do conhecimento.
As perícias criminais atuais, regra geral no Brasil, e não como as do júri do "Caso Isabela", são as mesmas de 30 anos atrás e isso acarreta grande prejuízo para os julgamentos em todo o país.
6 comentários:
Parabéns pela visão lúcida sobre o problema, li seu resumo de criminologia quinta edição e achei fantático, não é um "resumo" é um introdução á criminologia, rené, floripa.
Perfeito ... Vou redirecionar no meu blog. Abraços
Dr. Lélio, sua postura de criminólogo, voltado para os problemas concretos da vítima e dos acusados, nos dá a garantia que temos uma criminologia voltada para os problemas brasileiros também, Avante, como diz LFG, Samuel, Niterói.
concordo com o autor, as perícias criminais na maior parte do país são bem antigas, nada de luminol, coleta de digitais etc., rubens, salvador.
Concordo plenamente com sua visão. Foi formado um palco midiático em cima do caso que causou muita turbulência nos trabalhos periciais. Seu artigo é muito sensato, parabéns! Desde já, sigo-o.
Seu livro de Criminologia é o mais vendido do Brasil e não é por outro motivo. Sua opinião e você sempre frisa isso, uma opinião, e não uma declaração de verdade como a gente vê muito o pessoal do direito se gabando de serem os donos da verdade, nos dá segurança para enter melhor os meandros da justiça penal no Brasil, Rosalina Borges, Guarulhos.
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