domingo, 16 de agosto de 2009

O Blogueiro Caio César postou o seguinte post:
Como de costume, antes de ir para o estágio (12:00), dou uma conferida em alguns Blogs que tratam direta ou indiretamente de questões relacionadas às ciências criminais. Um destes Blogs que visito é o do Prof. Lélio Braga Calhau (Criminólogo, Promotor de Justiça e autor da obra "Resumo de Criminologia"), que ontem publicou o texto que agora colo abaixo:
Periculosidade no Direito PenalFalar em periculosidade hoje na comunidade penal é um tabu. Isso é "direito penal do inimigo", dizem muitos.
Periculosidade é "direito penal do autor", dizem outros. Periculosidade é inconstitucional. E seguem coisas do tipo.Agora, me pergunto, se isso faz desaparecer as coisas? Negação é um mecanismo de defesa freudiano utilizado pela maioria dos penalistas. Eles negam o fato. Podem tratar a periculosidade como queiram, mas fato é que ela existe. Não vai desaparecer por conta desse discurso abstrato e fajuto.
Não é negada pela Psicologia, Psiquiatria, Sociologia etc. É uma verdade. Enquanto isso, encontramos cada vez mais "predadores" agindo no meio da sociedade e quase nada fazemos. Assaltam, estupram, matam várias vezes e não reagimos. As vítimas, quase sempre, são as mesmas pessoas indefesas (mulheres, idosos e crianças).Precisamos parar com hipocrisia. É importante promover a descriminalização de uma grande gama de infrações criminais menores (ex: contravenções) e centrar esforços na repressão de crimes mais graves. Nesse contexto, a reposta penal para o crime de roubo (artigo 157 do CP) no Brasil é para lá de insuficiente.
http://www.novacriminologia.blogspot.com/Por gostar muito de criminologia e já ter lido alguma coisa, fiquei espantado com este discurso, principalmente por ter sido publicado num Blog intitulado de 'NOVA Criminologia'.
Qualquer inocente (leia-se leigo) que passa por ali vai imaginar que esta mentalidade realmente simboliza 'a' NOVA Criminologia e que chamar de PREDADOR pessoas que cometem crime - seja ele qual for - não tem nada a ver com Direito Penal do Inimigo ou Direito Penal do Autor. Aliás, sempre que leio esta palavra (predador), lembro-me do famigerado "Sexually Violent Predadors Acts", do Estado de Washington), que, obviamente, não deve servir de exemplo para o Brasil, como quase tudo que os EUA fazem no que toca à política-criminal.Uma criminologia (ou um criminológo) que pretende incutir novamente na criminologia um "juízo de periculosidade" pode apelidá-la de tudo, menos de NOVA. Zaffaroni indica que o "perigosismo médico/policial" é proveniente do século XIX (Buscando o Inimigo: De Satã ao Direito Penal Cool. In: MENEGAT, Marildo; NERI, Regina (Org.). Criminologia e Subjetividade. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 11). Daí a pergunta que inaugurou este post, que, é preciso dizer, tem unicamente o objetivo de provocar um debate e não uma discussão, e a direciono humildemente ao Prof. Lelío: QUÊ(M) É O PERIGOSO?
Não se trata de um discurso "abstrato e fajuto", mas de reconhecer que o Direito Penal, se ainda quer se manter vivo no Brasil, país de modernidade tardia e de incontáveis (ab)usos do poder de punir, deverá divorciar-se definitivamente da crença ingênua e arbitrária de taxar o outro de PERIGOSO. E vou além no meu questionamento ao Prof. Lélio: o que melhoraria no Direito Penal se a tirania da periculosidade o invadisse de vez?
O que não dá pra duvidar é que alguns juízes iriam adorar, pois isso reduziria o trabalho deles na fundamentação dos decretos de prisão preventiva e sentenças condenatórias - " - ora, o acusado é perigoso, querem mais o quê?".
E eu não quero discutir se a Psicologia, a Sociologia ou a Psiquiatria não negam a periculosidade, mas justamente saber/questionar em quais aspectos isso pode revolucionar o Direito Penal ao ponto da anunciada 'hipocrisia' acabar.
Quando se propõe a descriminalização das contravenções penais, mas ao mesmo tempo defende-se o aumento da pena do roubo (art. 157 do CP), não se está inserindo, arbitrariamente, no tipo penal uma ABSTRATA noção de 'periculosidade antecipada'?
O (meu) Direito Penal não combate perigos, Prof. Lélio. Não me leve a mal, mas isso é Direito Penal do Inimigo SIM. Jakobs - que obviamente não taxaria de PERIGOSO um sujeito que cometeu um roubo -, ao propor que enquanto "el Derecho Penal del ciudadano mantiene la vigencia de la norma, el Derecho penal del enemigo (en sentido amplio: incluyendo el Derecho de las medidas de seguridad) combate peligros; con toda certeza existen múltiples formas intermédias" (Derecho Penal del Enemigo. Madrid: Civitas, 2003, p. 33), certamente não quer defender outra coisa senão a punição desmedida do "perigoso", do "predador", do... a criatividade entra em cena.Salo está coberto de razão quando diz que "a ingenuidade da crença moderna na capacidade de [...] a criminologia reformar as classes perigosas [...] reforça a concepção metafísica que transformou a questão dos Direitos Humanos em cenário de ficção científica" (Antimanual de Criminologia. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 113).
Não negamos o fato, Prof. Lélio. SER perigoso, que eu saiba, (ainda) não é crime. Possuímos, e isso não é hipocrisia, um direito à perversidade. Isso não significa ignorar o sofrimento das vítimas, tampouco negar que a sanção deve proceder o crime - e não precedê-lo, frise-se.E voltamos na pergunta inicial: QUÊ(M) É O PERIGOSO, Prof. Lélio?
Seguindo o mesmo raciocínio, embora com a atenção voltada às medidas de segurança, Virgílio de Mattos traz uma reflexão interessante: "Não me canso de dizer que o curioso é que ninguém diz perigoso ao construtor inescrupuloso, ao banqueiro que leva à miséria seus clientes, ao dono do latifúndio improdutivo, ao dono do hospital psiquiátrico que se enriquece com o desespero alheio. Perigoso, diz a doutrina, é o portador de sofrimento mental que comete crime” (Trem de Doido: O Controle Especial do Controle Total. In: MENEGAT, Marildo; NERI, Regina (Org.). Criminologia e Subjetividade. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, 72).
Ficam estas indagações.

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